Se as épocas árabes e medieval coexistem na antiga Almedina, o nosso ponto de partida é em falso — uma fachada rococó com algo de renascentista recebe-nos a meio caminho do topo da cidade. É a Casa del Monte, bem na Praça da Constituição, o salão de visitas de Baena que nos recebe com um pouco de Itália — o que se calhar não está completamente deslocado, uma vez que o império romano também chamou casa a estas paragens. A sua herança mais imponente não a vemos — o sítio arqueológico de Torreparedones desvendou uma cidade que foi ibera e teve castelo medieval, mas foram os romanos que lhe legaram um fórum que é uma espécie de “Vitrúvio da arquitectura”, tal a perfeição das proporções. Porém, o Museu Histórico e Arqueológico Municipal é romano q.b.: da pré-história aos iberos (e os seus rituais funerários com abundância de ex-votos), terminando na Idade Média (repartida por visigóticos, muçulmanos e cristãos), é Roma que prevalece, reflectindo a forte romanização da região.
Priego de Córdoba
Em Baena contactámos com a história do azeite, em Priego de Córdoba provamo-lo. É a primeira coisa que fazemos, aliás, e é a primeira vez que fazemos uma prova de azeite “profissional”. É na sede do Conselho Regulador da Denominação de Origem Priego de Córdoba que temos um curso rápido de azeites, supervisionado por Rafael Rodriguez, técnico de qualidade habituado a receber os muitos turistas que procuram esta actividade. Confessamos a nossa inépcia para descrições sobre o que provamos, mas no final é indubitável: depois do azeite extra virgem até o virgem nos parece mau.
Não mau como o azeite que dizem lampante (termo usado para descrever o azeite impróprio para consumo) e cujo cheiro antigamente povoava o centro de Priego de Córdoba, no tempo em que havia muitos lagares aí. Idos os lagares, na cidade respira-se a harmonia entre o barroco andaluz de inúmeras igrejas, o labirinto muçulmano do Bairro da Vila e a água que corre em abundância. “Quando meia Espanha está com seca, aqui nunca falta água”, dizem-nos. A prodigalidade desta exibe-se na Fonte do Rei e na Fonte da Saúde, onde chegamos caminhando entre casonas sumptuosas, com fachadas inesperadas, nas quais tanto nos deparamos com pormenores de arte nova como mudéjares, agora abraçadas a edifícios mais modernos.
Se uma é a Fonte do Rei, é a outra que tem ligações régias, pois diz-se que aqui terá montado acampamento Alfonso XI, durante a reconquista. A Fonte da Saúde é também a mais antiga (século XVI), frontispício maneirista, encaixado no declive, como uma espécie de altar natural. Mas como não sentir a sombra da Fonte do Rei, três tanques em cascata, forrados a mármore policromado, com 139 canos a desaguar neles e com Neptuno bem no centro?
Inesperadamente aquática, a cidade que se ergue sobre a planície de olivais. O Adarve é o melhor caminho para perceber a simbiose entre a natureza e o humano, abraçando o bairro da Vila, que muitos comparam ao granadino Albacín ou ao bairro judio de Córdova. É aqui que Priego de Córdoba se transforma num pueblo suspenso no tempo, um dédalo de ruelas onde os carros não chegam, que por vezes terminam em minúsculas praças — pátios para as casas em volta. A arquitectura parece de brincar, por vezes, na alvura imaculada das fachadas simples e pitorescas, manchada de flores que vêm de todos os lados — e não visitamos o bairro na Primavera, quando se torna um arco-íris florido.