Mas em Portugal muitos troços foram desactivados sob o argumento do número reduzido de passageiros.
A questão da pouca utilização tem a ver com as infraestruturas, que têm de ser renovadas. O que lá estava era uma estrutura que tinha quatro ou cinco vezes mais do que um ciclo de vida normal. Se nós tivéssemos uma auto-estrada Lisboa-Porto com um tapete de asfalto de 60 anos, seguramente que o volume de tráfego seria inferior.
O facto de o eixo mais utilizado ser o que une Braga a Faro não é um reflexo da migração das populações para o litoral?
A questão da litoralização da população não está directamente relacionada com os tráfegos. Quando consultamos as estatísticas das deslocações diárias em muitos sítios do Alentejo onde outrora existia comboio, verificamos que, apesar de a população ter diminuído, as viagens são em maior número, porque os serviços e empregos concentraram-se nas capitais de distrito. Atendendo a isto, esperava-se que a oferta de transportes públicos, nomeadamente autocarros, fosse maior, mas não. Toda a gente foi incentivada a viajar de automóvel e o comboio começa a ser algo de exótico.
Enquanto no resto da Europa o comboio é o transporte do presente e do futuro, aqui é uma espécie de relíquia.
Mas o conceito de transporte colectivo cabe na sociedade contemporânea, marcada pelo individualismo?
Eu não penso que a sociedade portuguesa seja mais individualista do que a espanhola ou a francesa. Há a ideia de que as pessoas já não andam de comboio porque melhoraram o nível de vida. Mas se assim fosse, um país como a Alemanha, que é o terceiro maior do mundo em viagens de comboio per capita, era um país onde as pessoas tinham um salário miserável. E sabemos bem que não é assim.