Fugas - Viagens

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São Petersburgo: a janela virada para a Europa está a abrir-se para nova revolução

Em 1709, os russos derrotaram os suecos em Poltava, colocando um ponto final no domínio destes últimos no Báltico. Milhares e milhares de prisioneiros suecos foram obrigados a trabalhar (e pereceram) na construção do sonho de Pedro e ainda hoje são muitos os que acreditam que, tendo nascido maldita, São Petersburgo acabará, mais dia, menos dia, por se afundar, porque as centenas de ilhas em que se apoia cederão como frágeis nenúfares — uma maldição que se evoca sempre que as águas do rio transbordam e inundam a cidade, o que já aconteceu mais de 150 vezes desde a sua fundação.

Pedro, o Grande, estava mais preocupado com a ostentação e em mimar São Petersburgo com todos os luxos. Em pouco tempo, decretou que todas as casas viradas ao rio teriam de ser construídas em pedra — e o mesmo se aplicava às famílias ricas, com ou sem vista para o Neva. Em 1712, a cidade era uma realidade que enchia de orgulho o czar e em 1725, ano da sua morte, São Petersburgo contava já com mais de 40 mil habitantes. Sucederam-se reinados fugazes, o de Isabel, filha de Pedro, entre 1741 e 1762 (foi ela quem contratou o arquitecto Bartolomeo Rastrelli), o de Pedro III (neto de Pedro, o Grande e apenas no trono durante uns meses) e o de Catarina II, a quem se atribui, embora carecendo de provas, o assassinato do marido, Pedro III. A czarina esteve no poder 34 anos, um período que aproveitou para aumentar a já considerável colecção de arte iniciada por Pedro e a de amantes (para eles mandou construir alguns palácios), mas também para redesenhar a cidade, abandonando o barroco por troca com o neoclássico.

Do apogeu ao declínio

O tempo e a revolução industrial definiam o rumo de São Petersburgo em finais do século XIX. A cidade, ligada a Moscovo por canais, transformava-se, subitamente, num centro onde a indústria se semelhava a um vulcão em erupção, num enxame de fábricas e de mercadorias que tanto chegam transportadas por barcos a vapor como por via ferroviária. Abundavam os funcionários, dando asas à burocracia para manterem as suas funções, os ilustres, os nobres e os pensadores de um pensamento sem limites. O poder, esse, permanecia absoluto mas as sementes da luta contra a autocracia já haviam sido colocadas na terra e difícil se tornava travar o seu processo de crescimento. Sucediam-se as tentativas: em 1825, um grupo, conhecido como os dezembristas, defendia uma sociedade mais aberta, sem preconceitos, disposta a viver sem servos. Sem sucesso — as suas cabeças, pendendo sob a forca, nada mais poderiam exigir, tão pouco clemência. O medo instalara-se, como uma lapa sobre uma rocha, nada prometia mudanças até que, no início do século seguinte, em 1905, o povo saiu à rua para exigir reformas.

Um domingo sangrento

Centenas de manifestantes, protestando pacificamente e dispostos a entregar uma petição ao czar Nicolau II, foram silenciados pelas armas dos militares quando se encaminhavam para o Palácio de Inverno cantando God Save the Czar. Mas 12 anos mais tarde, a 23 de Fevereiro de 1917, quando se podia caminhar sobre as águas geladas do Neva, a população, cheia de fome e órfã de direitos, voltou a expressar o seu descontentamento, primeiro em frente ao Palácio de Inverno, depois em redor das fábricas apelando a uma greve geral. No dia seguinte, mais de 250 mil pessoas vagueavam pelo centro da cidade e o czar, mal a notícia lhe chegou aos ouvidos, mandou restabelecer a ordem pública. Os militares, desta vez, baixaram as armas e caminharam ao lado dos manifestantes — era o fim de 300 anos de dinastia Romanov e de 500 da autocracia czarista e o início de um período ainda mais turbulento, marcado por uma guerra civil e duas guerras mundiais.

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