E tanto mudou em tão pouco tempo.
Em 1914, com a entrada da Rússia na guerra, São Petersburgo passa a ser Petrogrado; dez anos mais tarde, com a morte de Lenine e numa altura em que a capital já fora transferida para Moscovo, torna-se Leninegrado; em 1991, após um referendo, volta a ser São Petersburgo, uma variedade toponímica que dá azo a anedotas. Durante um censo, um jovem inquire um homem na Avenida Névski:
Onde nasceu? Em São Petersburgo.
Onde frequentou a escola? Em Petrogrado.
Onde vive actualmente? Em Leninegrado
Onde gostaria de viver? Em São Petersburgo.
Mas não foram apenas os nomes que mudaram, também alguns dos lugares mais emblemáticos da cidade passaram a ter outras funções: a imponente catedral de São Isaac, lugar de culto, transformou-se em museu ateísta. E aquele que era o Palácio de Inverno em Hermitage.
E quem, numa visita a São Petersburgo, lhe resiste? Apenas um idiota, com a devida vénia a Dostoiévsky. Se, na cidade, tudo parece envolto por uma aura de grandeza, no museu essa dimensão exacerba-se: são 2500 salas, 24 quilómetros para cá e para lá, mais de três milhões de obras de arte, entre as quais quase 15 mil quadros, mais de dois milhões de visitantes por ano — tudo ao longo de seis majestosos monumentos.
Sobre as margens do Báltico, a escassos quilómetros de São Petersburgo, com a sua fachada pintada de amarelo contra um céu com nuvens, exibe-se, em toda a sua imponência, a Peterhof, a residência de Verão de Pedro, o Grande. Daqui, rodeado de jardins e de lagos, o czar, fundador da marinha russa, dominava o mar que tanto o seduziu ao longo da sua vida. Por esse tempo, as estradas estavam em muito más condições mas esse não era o único motivo pelo qual o czar chegava à sua residência de Verão de barco — era pelo prazer, pela sua forte ligação ao mar e à água.
A partir de 1710, Pedro mobilizou diariamente milhares de operários para criar uma rede de adução de água e desse labor e dessa vontade resultaram mais de vinte quilómetros de canos que ligam as diferentes fontes e repuxos entre elas. Ninguém fica indiferente à Grande Cascata, em frente à entrada do grande palácio, ou à Cascata do Leão, decorada com colunas iónicas esculpidas do granito negro e do mármore e erguida já no século XIX, com mais de 170 repuxos. Quando se olha para o Peterhof, a comparação com Versalhes é instantânea — Pedro, o Grande, convidou um jovem arquitecto francês, Jean-Baptiste Le Blond, claramente influenciado pelo genial André Le Nôtre, para desenhar a estrutura. Vítima de uma morte prematura, Le Blond já havia, no entanto, traçado os planos e, dessa forma, os seus sucessores, o italiano Michetti e o alemão Braunstein, prosseguiram a sua obra.
Um casal, recém-casado, recebe nas mãos duas pombas brancas e logo as liberta. Elas batem as asas e sobem nos céus cinzentos.
- Gorko! Gorko!
Os convidados pedem e homem e mulher, tímidos, bebem vodka e beijam-se tendo como fundo a estátua do Cavaleiro de Bronze, a mais famosa de todas de Pedro, o Grande e imortalizada num poema de Pushkin. A noite cai rapidamente sobre Peter, como os locais a gostam de chamar, no Neva ergue-se uma ponte para deixar passar um navio e as suas águas são a esta hora um espelho frio onde se reflectem todas as luzes de tantas e tantas janelas.