Fugas - Viagens

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Nápoles: A sedução do mau caminho

Por Mara Gonçalves

É a ovelha negra das grandes cidades italianas e provavelmente não será amante para todos os corações. Mas entre o desalinho frenético e sem rodeios há uma história de milénios, tradições vincadas, vistas sobre o Vesúvio e a baía e pizza, muita pizza.

É suja, desalinhada e intrépida. Não tem os monumentos nem a arquitectura pitoresca de outras paragens italianas (e à maioria dos que tem falta-lhes aquele brilho lustroso e as linhas magnânimas de postal). Quando lá estivemos, os principais edifícios estavam quase todos de fachada tapada, em restauração; havia obras por todo o lado, alterações ao trânsito caótico.

Entre as grandes cidades de Itália, é a ovelha negra: a feia, a decadente, a dominada pelo desemprego e pela mafiosa Camorra. Mas é também cidade de uma história de milénios, de igrejas e museus, de vistas soberbas sobre o Vesúvio e a baía. “O napolitano seria certamente um outro tipo de homem se não se sentisse encurralado entre Deus e Satanás”, antecipava Goethe em Viagem a Itália, quando se enamorou pela cidade áurea dos finais do século XVIII.

Se Roma é para turista ver, Nápoles, antevemos ao primeiro minuto, é para turista sentir. E aqui sente-se com todos os sentidos alerta, numa disputa titânica e incessante por atenção. O barulho do trânsito infernal e o ruído de uma população que só fala a gritar. O cheiro a mar, a comida e a lixo. O olhar que se perde em toda as direcções na vã esperança de abarcar tudo. A mão que se agarra instintivamente à mala, a uma cerveja, a um pedaço de pizza. E por aqui morre também o paladar, adormecido no prazer da pasta e das doses industriais de mozzarella.

É uma cidade com a alma na boca, no corpo, nas ruas. Sem contenções, sem esconder rugas nem cicatrizes, sem escrúpulos ou grandes cortesias. É a sedução libertadora do mau caminho.

Vida de bairro

Vagueamos pelo apertado quadriculado do Quartieri Spagnoli, onde um céu de bandeiras transforma as ruas, já estreitas e sombrias, em autênticos corredores de penumbra. São fileiras e fileiras de panos coloridos dançando ao vento. Aqui uma grande, verde, branco, vermelho, estendida quase de um lado ao outro da rua. Ali muitas, de médio tamanho, pequenas, umas na vertical, outras na horizontal, delicadas dançarinas de orgulho italiano, que quase nos roçam os cabelos e nos vão guiando de olhos no ar pelo labirinto de vielas e becos.

Mais perto da movimentada e turística Via Toledo, uma das avenidas principais do centro de Nápoles, o tecto de bandeiras internacionaliza-se e chega a quase todas as geografias do globo; porventura um chamariz turístico para aquele que é talvez o bairro típico mais acessível a quem visita a cidade.

O quarteirão, que vai subindo a colina em direcção ao Castel Sant'Elmo, terá sido construído no século XVI, quando Espanha tomou Nápoles aos franceses que, por sua vez, se tinham apoderado da cidade no rescaldo das Guerras de Itália. Falar de Nápoles é falar de uma das mais antigas cidades da Europa, com 2800 anos de história e uma sucessão contínua de domínios, guerras e independências (sem falar de pestes, terramotos, erupções do vizinho Vesúvio e da destruição deixada pela Segunda Guerra Mundial).

Foi grega, romana, germânica, normanda, aragonesa, francesa, espanhola, austríaca e finalmente italiana. Uma ecléctica herança (e uma história de sobrevivência indissociável da personalidade napolitana, acreditamos) que se inscreve em vestígios e monumentos um pouco por toda a zona histórica da cidade e que levou a UNESCO a classificá-la como Património Mundial em 1995.

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