Aqui parece que há uma espécie de mentalização de que o turismo vai decrescer. “Vimos o que aconteceu em Paris.” Curiosamente, não faltam exemplos de cidades atacadas por veículos (Nice, Berlim, Estocolmo — daí o dèja-vu), mas em Paris foram bombas as armas utilizadas. Em vários pontos da cidade.
Se os planos iniciais aqui seriam outros, a verdade é que acabaram por se restringir à Rambla. Segundo um estudo realizado em 2016 pela Associação Amigos da Rambla citado pelo jornal El Mundo, por esta passam anualmente cerca de 78 milhões de pessoas, apenas 20% das quais de Barcelona. “Uma geração de barceloneses foi para as Ramblas para tornar-se adulto. Já ninguém permanece nas Ramblas. Ninguém permaneceu nas Ramblas após o ataque. Todos nós ficámos nas Ramblas no dia seguinte”, escreveu ainda Miqui Otero no texto que intitulou “Volveremos a cruzar las Ramblas”. Talvez os barceloneses voltem a cruzar as Ramblas, sim. Com vontade. Talvez até o desiludido Pep Sanchez recupere um hábito antigo: “Há anos sim, andava muito, Rambla arriba, Rambla abajo”. Afinal, como canta Manu Chao, espécie de filho adoptivo da cidade (e, dizem, vizinho da Rambla, na Praça Real), “rambla pa’qui rambla pa’llá, esa es la rumba de Barcelona”. E essa rumba já não se dança sem os turistas.
Roteiro por uma Barcelona que no té por
Uma Barcelona que não tem medo teria saído para as festas de Gràcia, canceladas no dia a seguir ao seu início por causa do período de luto decretado, e não perderá as festas de La Mercè (a padroeira da cidade), as maiores da cidade, que vão acontecer entre 22 e 25 de Setembro. Vai continuar a assistir a concertos e cinema ao ar livre em Montjuic acompanhada dos turistas que vão ver o espectáculos de luzes e água que todos os finais de tarde se realizam nas fontes da escadaria que leva ao Museu Nacional de Arte da Catalunha (no extremo oposto da Praça de Espanha) e ninguém deixará de ler e fazer piqueniques no Parque da Cidadela. Claro que se manifestará na “Diada”, o 11 de Setembro da Catalunha e o seu dia nacional, este ano (ainda) mais animada pelas questões independentistas, uma vez que a Assembleia Nacional da Catalunha quer realizar um referendo a 1 de Outubro (e de certeza que os atentados na região autónoma farão parte da agenda).
Sim, serão ocasiões de grandes concentrações humanas, que o estado de alerta em Espanha (e em tantos países europeus) desaconselha, mas é assim que os catalães mostrarão que “são livres”, como nos dizia Mar Galván, na Rambla — uma liberdade reivindicada desde 1714: “Viveremos livres ou morreremos” (“Viurem lliures o morirem”). Na ocasião, “morreram”, perderam a sua constituição, as suas instituições, universidades, foi-lhes proibida a língua. Agora, vivem.
A cidade retomou o ritmo normal e, em Agosto (como em todo o Verão), isso até significa um ritmo mais lento — turistas em magotes encontram-se por todo o centro da cidade, sobretudo na Cidade Velha —, obrigando a abrandar o passo a quem faz a sua vida quotidiana e muitas lojas “locais” fecham as portas como sempre o fizeram neste mês de estio (esperem-se muitos sinais de “Trancat per vacances”). As praias de Barceloneta, como sempre, rebentam pelas costuras (por estas caminham os vendedores: artesanato, contrafacções, massagens), e não é de barceloneses — estes preferem praias um pouco mais afastadas, de Poble Nou para cima. Poble Nou, aliás, está cada vez mais na moda: de aldeia piscatória a centro de grandes empresas, aqui prédios novos atraem cada vez mais jovens que optam por comprar casa e encontram na sua Rambla entretenimento q.b..