Jay tem 23 anos e descende de uma tribo no Laos. Os pais morreram quando era muito jovem. Talvez acidente, doença ou guerra. Não especificou. Foi criado pelos avós, que hoje têm quase 90 anos. Começou por ser monge - um caminho comum, no Laos, sobretudo para as famílias mais pobres, que têm a possibilidade de fazer o pagamento em cereais, vegetais ou frutas cultivadas nas próprias hortas.
Jay tinha dois trabalhos, em part-time, em Luang Prabang, a segunda maior cidade do Laos. Confessa que ganhava bem, para os padrões locais, mas decidiu mudar-se para Huay Xay, no Sul, para estar próximo da família que lhe resta.
Huay Xay é uma pequena cidade nas margens do rio Mekong – que separa, naturalmente, o Laos da vizinha Tailândia. Para quem chega de noite, parece saída de um filme de cowboys, mergulhada na escuridão, sem vivalma nas ruas. Com o raiar do dia, emergem cores pardacentas, próprias de algumas construções inacabadas que enchem a rua principal, onde famílias inteiras moram em casas amontoadas num prédio sem fachada. Não é preciso ser o big brother para espreitar a rotina daquelas pessoas: está ali, aos olhos de quem passa.
A cultura local foi invadida pela modernidade de um turismo recente – o que resulta numa mescla algo confusa de pequenos restaurantes tradicionais com modernos cafés, que oferecem brunch aos turistas pelo preço de um almoço na Europa.
Exemplo de uma modernidade que procura conciliar-se com a flora e fauna locais é a Gibbons Experience - uma empresa que, desde 1996, desafia os mais aventureiros a fazer trekking na floresta, percorrer longas distâncias de zipline e dormir numa cabana a mais de 40 metros de altura. Jay é guia em full-time. Bem-disposto, com sorriso franco e aberto, tem aspecto de menino franzino. Mas o trabalho duro e, talvez, a vida deram-lhe uma resistência física incrível. Tem apenas uma folga a cada seis dias e é um dos 120 trabalhadores da Gibbons Experience que, através do turismo de aventura, contribui para a conservação e sustentabilidade da floresta Bokeo – considerada Parque Natural desde 2008 - e dá trabalho às populações locais, que asseguram o transporte dos viajantes, a limpeza das cabanas e a alimentação.
O dia começa bem cedo no escritório. Dezenas de pessoas vão chegando e amontoam-se numa pequena sala enquanto aguardam por indicações dos guias. A primeira recomendação é: “Deixem as vossas malas aqui. Levem o mínimo essencial. Lembrem-se que, depois, terão de passar três dias com o peso às costas.” Alguns backpackers mais corajosos não quiseram deixar as bagagens, mas a maioria ouviu o conselho e preparou-se para seguir viagem apenas com uma pequena mochila com uma ou duas mudas de roupa, artigos de higiene (de preferência, em versão miniatura), um boné, repelente e uma garrafa para poder encher de água ao longo do caminho.
A primeira parte do percurso é feita em carrinhas pick up, onde os mais sortudos conseguem um lugar do lado de dentro, mas a maioria senta-se na parte de trás e tem de segurar o estômago ao longo de uma estrada muito sinuosa. A dada altura, a carrinha sai da estrada e entra pelo meio do mato. Literalmente. Sem o mínimo sinal de estradas secundárias ou caminhos entendidos como tal.