São grãos verdes e com traços identitários os que temos diante de nós e que os provadores colhem nas mãos para levar ao nariz. Inspirar. É um dos passos da análise a que se submetem os grãos antes de serem moídos. Há ainda o exame visual, que detecta defeitos, inertes e compara com os padrões. O robusta, descrevem-nos, é arredondado, esférico, de cor amarelada e acastanhada - na mão vemos um grão com defeito, está furado; o arábica natural é mais comprido, achatado, com um filamento interno em forma de "s" e cor mais esverdeada mas com película de notas acastanhadas; o arábica lavado é quase igual, mas com tonalidades que balançam entre o verde e o azul, sem película. Colocados num crivo - caixa com várias peneiras, abanada como uma matraca - determina-se o seu tamanho (aqui, o tamanho é importante: quanto maior melhor, porém, o padrão é o de cada região, não um valor universal); há análises químicas que são feitas - e um computador onde todos os parâmetros de cada amostra são inseridos para a classificação. "Conferimos os parâmetros físico-químicos", explica Alexandre, "mas a prova de taça é que interessa".
Do verde ao torrado
A longa fachada branca que nos recebe não esconde a antiguidade: brilha como nova mas tem a aparência venerável dos edifícios industriais antigos, com enormes janelões e sóbrios motivos decorativos. Data de 1920 e é património classificado pelo IGESPAR. Já foi uma tecelagem, agora alberga a sede da empresa que detém a Torrié. Para chegar à torrefacção, contornamo-lo, entre aroma de café que paira intenso, até outro edifício nas traseiras. É aqui que se armazenam, desenvolvem e produzem os cafés da Torrié.
Fazemos o percurso do café quando chega e vamos directos ao armazém de café verde. Há um aroma intenso - herbáceos, esclarece Pedro Ribeiro, mas as alergias já haviam dado o alerta - que nos envolve quando entramos nos amplos espaços de pé direito imponente onde se amontoam sacos de café (em juta natural, que não interfere com o aroma), separados como ilhas, que vão de cima a baixo amparados por vigas de madeira, e com pequenas lousas com os dados de café escritos a giz.
"Pode parecer arcaico mas é a melhor maneira de acondicionar o café." Tem a humidade certa, permite trocas gasosas - "num silo podia ter problemas". É aqui que se recolhem as amostras do café que chega em contentores e que é necessário comparar com a matéria-prima encomendada várias semanas antes: com um colhedor de amostras, algo tipo picador de gelo, com que se fura e fecha novamente o saco.
Não duram muito tempo aqui os grãos, que chegam de várias partes do mundo. "Estamos sempre à procura de novas origens", avança Alexandre Almeida. E a verdade é que o mercado dos cafés está em evolução e aos produtores clássicos se têm juntado "países não tão visíveis há uns anos". Aos produtores tradicionais da América Central (de boa qualidade geral: "os tipos de árvores e as plantações são interessantes, estão mais rotinados, os standards são bons e a técnica predominante [processamento lavado] faz com que a probabilidade de defeitos seja menor"), juntam-se um punhado de africanos (incluindo Angola, com o robusta, e Quénia, Etiópia e Ruanda, com o arábica) e asiáticos (Indonésia, Papua Nova Guiné), que agora têm a companhia (concorrência) do Laos e Vietname, por exemplo. E não se detêm muito tempo no armazém os grãos, dizíamos, porque, por regra, "depois de dois meses começam a perder lentamente qualidade" - depois da torrefacção, "aos seis meses está muito bom", mas este é um aspecto que varia "com a origem e o modo de torrar".