Fugas - Viagens

  • Reuters/Mariana Bazo
  • Ireneu Teixeira
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Amazónia: Mergulhar na floresta

Confesso que só o enxame de motociclos quebrou um pouco do romantismo daquela paisagem marinha, um manancial de motivos que dariam inúmeras aguarelas e óleos a William Turner. Antes de seguir para o rio Tefé, afluente da margem direita do gigante Solimões, que muda de nomenclatura para Amazonas quando, em Manaus, encontra o rio Negro, avio-me em terra, no caso, no Mercado Municipal. Deparo-me com uma espécie de sinopse do que haverá nas cercanias: latões com açaí, cachos de bananas, peixes aguardando comprador e gatos esperando as sobras dos assados que luziam no cimo da escadaria de betão.

Os decibéis proferidos por um pastor em cima de uma coluna de som não despertavam o sono profundo de algumas “ovelhas tresmalhadas” que dormiam debaixo das bancas de legumes. Para além das frutas, abastecemo-nos de um repelente na barraca do taxista que nos transportou do aeroporto ao porto de Tefé. Garantia de sucesso a cem por cento contra o mosquito da malária, que é freguês habitual nestas paragens.

Foi com algum desalento que abandonei este inusitado modus vivendi, mas Choca aguardava-nos na lancha para cumprir a última etapa, por sinal a mais fascinante. Por entre uma miríade de canoas e embarcações de portes vários, a lancha já se desenvencilhou daquele caos organizado e seguiu em direcção ao Solimões, ou Amazonas, assim baptizado logo na nascente no Peru, onde estão as raízes de Choca, expressas nas suas feições acobreadas de linhas arredondadas, de lábios carnudos e nariz achatado. De gestos mansos e olhar de rapina, Choca fala o quanto baste, bem ao jeito dos caboclos, assim designados por resultarem da fusão de sangue indígena com o do homem branco.

Conhecedor profundo dos segredos da floresta, será o nosso anfitrião por alguns dias, na sua casa-pousada na comunidade Boca do Mamirauá. A jornada adquire contornos mágicos mal a embarcação adentra nas águas barrentas do Solimões. Cruzamos algumas comunidades ribeirinhas, no alto dos barrancos e, mesmo assim, assentes em palafitas, para evitar inundações na época das cheias, cujas águas sobem aos 15 (!) metros, arrastando, entre outros, animais como os jacarés – a última enchente, a de 2014, foi a mais devastadora de que há memória, por culpa do famigerado “El Niño”.

Boquiabertos pelo encanto do lugar, passamos pelo primeiro encontro das águas (já observara o fenómeno em Manaus, entre os icónicos rios Negro e Solimões). Aqui é o rio Japurá, de águas escuras, que abraça o alvo Solimões. Apesar de o acontecimento não ser tão expressivo, não deixa de impressionar, tal como assistir, de camarote, às acrobacias traquinas dos botos, parentes próximos do golfinhos, que aqui vivem em liberdade total, havendo duas espécies a anotar: uma mais ameaçada e endémica, o cor-de-rosa e, estes, os cinzas ou tucuxis, mais abundantes. Seguindo pelo Japurá acima, atentamos nos encantadores ninhos dos japiins-xexéus. O nome é tão curioso quanto os ninhos em forma de saco pendurado, confeccionados nos ramos das árvores, evocando decorações natalícias. Trata-se de uma ave, de tonalidades garridas, conhecida por viver em bandos, fazendo um ruído cacofónico, por imitar as outras aves, não tendo canto próprio – segundo Chaco.

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