Ricardo Costa
Restaurante The Yeatman, Vila Nova de Gaia
É preciso navegar entre o Douro, aos pés de Gaia, e a ria de Aveiro para mergulhar no universo de Ricardo Costa. No derradeiro momento, ponderaria entre uma refeição no Vila Joya ou no Ocean, preparada por dois grandes chefs, ou voltaria às origens, à terra que o viu nascer, Aveiro, numa mesa povoada de memórias e sabores familiares, com pais, avós, tios, primos e amigos reunidos, como acontece em todas as datas festivas e os poucos momentos de convívio que sobram para além da azafama da cozinha.
O pedido: para começar, camarão da costa, ostras, percebes, berbigão, amêijoa; depois, se fosse Outono ou Inverno, uma caldeira de enguias, se fosse, na Primavera ou Verão, um leitão da Bairrada; por último, uns ovos moles de Aveiro ou um tiramisu, servido “bem gelado”.
É difícil traduzir por palavras as emoções de um homem, mas basta seguirmos o alinhamento de celebrações — aniversários, comunhões e outros rituais. “Nas datas festivas comemos leitão, nas mais importantes chanfana e nas muito importantes enguias, um prato menos acessível. Os ovos moles fazem sempre parte das mesas de Natal e passagem de ano”. O marisco chega pela via informal dos encontros de amigos, em que o chef, sem vontade de cozinhar quando sai da cozinha de todos os dias, se entrega a pratos menos elaborados e recebe sem pompa. Basta uma mesa variada e boa disposição, para ser do agrado de todos.
É hora de pensar naqueles que estão sempre longe da vista mas perto do coração. “Sou um marido, pai e filho ausente”, diz. Mesmo quando cozinha no The Yeatman, os pratos de peixe e marisco representam sempre esse regresso às raízes, as mesmas que a maturidade dos 37 anos lhe permite relativizar as estrelas. “Quando recebi a primeira tinha 29 anos, era a fase inicial em que queria mostrar e alcançar algo. Oito anos depois, as conquistas podem ser importantes para o negócio, mas não colmatam as ausências. Não tem preço o que se deixa de viver”, reconhece. É uma vida de sacrifício, de trabalho, de entrega. Quando, às segundas-feiras, sai, pela manhã, para Gaia, respira o cheiro da maresia trazida pelo vento e guarda essa sensação única. A última garfada, o último suspiro, bem podia saber a mar.
Nuno Bergonse
Freelance, Lisboa
Que seja a um domingo, com chuva. O cenário bucólico como pano de fundo para a última reunião da família. E, se pudesse ser, em casa. O momento teria uma forte dimensão emocional, daí a escolha do prato de Nuno Bergonse: “Uma sopa cozinhada pela minha mãe”. Assim como lhe deu a primeira refeição, seria a progenitora a confeccionar a última. Podia ser “uma sopa de entulho ou uma sopa da pedra sem carne e com muitos legumes, rica em couve, até ter de desapertar o cinto por estar tão cheio, como se fosse um dia de Natal”.
Comer sopa é um hábito que manteve diariamente desde criança. A educação alimentar veio acompanhada com uma filosofia de vida transmitida pelos pais, macrobióticos durante mais de uma década. “A minha mãe cozinhava tudo, desde o pão. Muitas vezes a sopa era a refeição e era bastante completa”, explica. Era preparada pela manhã e, ao pequeno-almoço, Nuno espreitava o que estava na panela e servia-se.