Fugas - Viagens

  • Um ciclista passa pela Praça de Tiananmen, em Berlim (arquivo).
    Um ciclista passa pela Praça de Tiananmen, em Berlim (arquivo). Guang Niu/Reuters
  • Em Xangai
    Em Xangai Reuters
  • Guerreiros de terracota no Museu de Qin.
    Guerreiros de terracota no Museu de Qin. Jason Lee/Reuters

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Ir à China ver o mundo a mudar

Outra vez no bulício da cidade nova, passa-se pela avenida que orla o distrito financeiro, avança-se pela rede intrincada de auto-estradas urbanas, deixa-se ao lado a aldeia olímpica e demora-se aí uma hora até que Pequim se extinga nos campos. Antes de a cidade ter assumido o rosto do crescimento explosivo do país, as encostas do Monte Tianshou (Longevidade Celestial) eram um lugar distante, o sítio ideal para os imperadores poderem aspirar a uma vida depois da morte pacífica e iluminada. Hoje, só a protecção oficial a uma área de 40 quilómetros quadrados impede que o lugar do seu repouso seja perturbado pela expansão urbana.

É aí que se encontram os mausoléus de 13 imperadores da Dinastia Ming (1368-1644), construídos na montanha de acordo com a filosofia do feng shui, que determina a localização dos edifícios em função das correntes de ar e do movimento do sol. A avenida de cerca de um quilómetro (Via do Espírito ou, noutras traduções, Via Sagrada), na qual os cortejos fúnebres tinham de passar antes do funeral propriamente dito, mostra-nos um desfile de estátuas de animais e de figuras da corte de grande beleza. No lugar ouve-se o vento e uma música instrumental distante. É bom estar ali, com pouca gente. Melhor até do que no mausoléu do imperador Yongle, o Ming que trouxe a capital de Nanquim para Pequim, que fez uma armada para conhecer o mundo (logo destruída pelo seu sucessor), que mandou construir a Cidade Proibida.

Nas cidades ou nas zonas mais afastadas há compassos de espera que custam a acreditar. Do monte Tianshou até à passagem de Juyongguan, o lugar mais emblemático da Grande Muralha, são aí 50 quilómetros, mas não se admirem se os vossos guias ou a vossa excursão tiver de passar por uma fábrica de closonet, uma loja de jade ou um supermercado de seda: faz parte das regras oficiais do turismo. Num desvio entre a tumba de Yongle e uma loja de closonet (que mostra bem as condições de trabalho médias dos operários chineses), surge uma auto-estrada cheia de camiões e, pouco mais à frente, Badaling.

É impossível, um erro, um absurdo ir a Pequim e não visitar este troço da Grande Muralha, na passagem de Juyongguan. Porque só estando lá se pode perceber que é mesmo grande; porque é uma fabulosa obra de engenharia militar; porque nos leva a entender o sacrifício dos milhões de pessoas que morreram na sua construção; e também porque ali se pode encontrar, uma vez mais, um bom retrato social da China de hoje: de jovens agitadas de calções, penteados ocidentais e máquinas de filmar na mão a uma mulher quase imóvel, vítima do terrível hábito de tolher os pés das mulheres, de velhos pequenos e secos a rapazes da era McDonald"s a deitar fora os bofes na subida mais íngreme, do parvenu rico, Nike nos pés e Channel nas têmporas, das zonas económicas exclusivas a camponeses dos arrozais angariados para excursões oficiais, há lá de tudo. Até um rapaz de uns 12 ou 13 anos com a camisola da selecção nacional que não nos entende quando dizemos "Portugal?", mas lá condescende após arriscarmos a fonética chinesa para o nome do país.

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