Não estivemos em Bogotá num domingo, logo não tivemos oportunidade de pedalar pelas suas avenidas; como não pudemos ir a nenhum dos seus célebres “mercados de pulgas”, cruzamentos entre feiras da ladra e mercados de rua, cada qual com a sua vocação mais ou menos definida, mas todos um ponto de encontro tradicional de bogotanos em busca de artesanato, antiguidades, especialidades gastronómicas, música e toda uma série de produtos novos e usados que a imaginação albergue. Mas vamos a Usaquén, onde se realiza um dos mais tradicionais destes mercados de pulgas — e vamos até lá agora porque é, sobretudo, a arquitectura colonial que recebe este mercado de pulgas que fechas dezenas de ruas. Até há poucos anos, era uma povoação fora da capital (de origem muísca), agora, somos acompanhados pela malha urbana até lá, bem no Norte, encostado às montanhas.
Em torno de uma antiga hacienda, a de Santa Bárbara (monumento nacional feito centro comercial), organiza-se o núcleo histórico desta localidade que mantém a aura dos pequenos pueblos. Organiza-se em torno de uma praça-jardim tradicional — bancos, árvores, relvados — encimada por uma igreja: às 19h dobram os sinos. A tranquilidade quebra-se nas ruas circundantes — de pubs irlandeses a cafetarias locais com fachada por detrás de gradeamento que enforma esplanadas, de bailaderos onde ao final da tarde já se dança nos terraços a bares cosmopolitas, do Crepes & Waffles (que não serve a tradição à mesa mas é referência por empregar apenas mulheres cabeças de família) ao El Corral que, asseguram-nos, tem os melhores hambúrgueres do país, de restaurantes de design aos diários. Ao domingo, as ruas são invadidas por vendedores e passeantes, “como formigas”, diz a proprietária do Usaquén Arte y Café (onde a cerâmica anda de mão dada com o café), em frente ao parque de estacionamento onde começou o mercado, muros cobertos de grafittis de personagens e locais históricos; num dia de semana há barracas brancas montadas junto da hacienda, algumas abertas.
Navegação circunvalar
Não é fácil mover-nos em Bogotá porque a cidade é um organismo em crescimento constante — a orientação faz-se de sul para norte, de oriente para ocidente, sendo que ela nasceu num canto agora a sudeste (a maneira mais fácil de percebermos mais ou menos onde estamos é tentar buscar os cumes montanhosos; na Candelária eles são sombra protectora). Numa cidade que viu a sua população multiplicar-se várias vezes ao longo do século XX, tendo recebido muitas vagas de deslocados pela instabilidade que a luta armada entre guerrilheiros e governo provocou no país rural, há áreas imensas cobertas de “favelas” nos seus limites; no seu interior também se vêem, sobretudo quando passamos pela Circunvalar (como nome indica, a artéria que ladeia o centro, rente ao sopé das montanhas, e que nada tem a ver com uma via rápida), onde uma curva nos mostra casario baixo, em tijolo cru ou ocre (muitas vezes em colinas ancoradas em muros de betão construídos para evitar os deslizamentos de terras frequentes) e a outra nos revela prédios modernos, em tijolo maciço (uma matéria-prima “barata, bonita e refractária”), com jardins pelo meio.