Chegámos no dia anterior e em poucas horas partiremos novamente para Puerto Maldonado, a cidade capital do departamento e da província, onde um pequeno aeroporto liga a Lima e Cuzco. O regresso ao hotel, Posada Amazonas, pertencente à comunidade e co-gerida com uma empresa privada, a Rainforest Expeditions, faz-se por um caminho mais longo — não se pode perder a oportunidade de observar a vida na selva e Marlene, a nossa guia, esforça-se para descortinar entre a vegetação excessiva sinais de vida. Sinais visuais, bem entendido, porque a selva é um organismo que pulsa de vida e esse pulsar é uma banda sonora em auto-play.
Avistamos um macaco, que não é um bugius, ou macaco-gritador como aqui todos se lhe referem, cujos gritos ouvimos várias vezes durante a nossa estadia (mas estes podem ser ouvidos até 16 quilómetros de distância…), empoleirado numa árvore não muito distante do trilho que seguimos religiosamente — mesmo que quiséssemos, e não queríamos, não poderíamos sair dele: as regras são claras e Marlene não se cansa de as repetir, não o podemos fazer para não perturbar o ecossistema.
Olhos então focados numa árvore, num dos ramos — mas só existem árvores, melhor, troncos, esguios ou colunas imponentes, porque as copas são uma abóbada cerrada que não deixa entrar luz, os ramos são como um mikado ainda mais baralhado por lianas, cipós e ainda por plantas epífitas que crescem nas árvores numa competição desalmada por luz, e não temos a certeza de entre tal abundância termos chegado a ver o macaco pichico, confirma a guia (macaco-esquilo, um macaco-prego ou um macaco titi são as outras espécies referenciadas nos terrenos da pousada). Nem os binóculos nos dão a certeza, mas gostamos de pensar que sim.
Não foi muito profícua em avistamentos de fauna a nossa aventura amazónica. A nossa chegada a Puerto Maldonado até prometia, avistamos indicações para Anaconda Lodge, Tarantula Eco-Hostel, mas Marlene rapidamente nos avisou (acalmou) — serpentes não se vêem muitas. “Quando alguém não as quer ver, então aparecem”, brinca. Pois não apareceram.
A Posada Amazonas é, lê-se no site, “perfeita para uma primeira experiência das maravilhas naturais da Amazónia” e é isso mesmo, um encontro suave com a vida selvagem, em contexto de ecoturismo puro, aquele que não só preserva o meio ambiente como ajuda as populações locais a desenvolverem-se. Por isso, a Posada Amazonas é da Comunidade do Inferno, que não visitamos porque preferem não se expor, e 90% dos funcionários são nativos, curiosamente poucos guias.
O contrato de leasing com a Rainforest Expeditions durava 20 anos, mas perto do final deste a comunidade considerou que não estava preparada para assumir a gestão sozinha — “houve muitas experiências más em outras comunidades, com falências” — e decidiu prolongar. Entretanto, está a preparar a sua gente: quem quer continuar a estudar (a comunidade tem escola e colégio, para estudos secundários), sai para fazê-lo e quando termina volta para trabalhar e, assim, pagar o “empréstimo”.