Fugas - Viagens

  • Praia em Lima
    Praia em Lima Enrique Castro-Mendivil/Reuters
  • Convento de São Francisco, Lima
    Convento de São Francisco, Lima Enrique Castro-Mendivil/Reuters
  • Praça de San Martín, Lima
    Praça de San Martín, Lima Mariana Bazo/Reuters
  • Huaca Pucllana
    Huaca Pucllana Mariana Bazo/Reuters
  • Varandas “gaudíanas“ de Miraflores
    Varandas “gaudíanas“ de Miraflores Pilar Olivares/Reuters
  • Praia de Agua Dulce, no distrito de Chorrillos, Lima
    Praia de Agua Dulce, no distrito de Chorrillos, Lima Enrique Castro-Mendivil/Reuters

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Lima não tem tempo para ser triste

Este é um bom ponto de partida para jironear pelas ruas (jirónes) em redor —  esticando-nos poderíamos chegar à Praça de San Martín, pelo Jirón de la Unión, uma espécie de espinha dorsal deste centro histórico que é património da UNESCO desde 1988. Não o caminhamos na totalidade e portanto não fizemos a união entre as duas praças mais emblemáticas da cidade, a primeira símbolo da herança colonial, a segunda símbolo da independência do Peru, tendo sido inaugurada no seu centenário, em 1921, e baptizada com o nome (e a estátua equestre) do libertador, José San Martín.

Curiosamente, o estilo arquitectónico desta é neocolonial com uns toques neoclássicos, o que lhe dá uma certa aura europeia, sobretudo nos edifícios de fachada branca, como o histórico Gran Hotel Bolívar (o nome é toda uma declaração de intenções: diante de San Martín só poderemos ter um Bolívar, terá dito o Presidente peruano, numa alusão aos movimentos independentistas da América do Sul) — declarado monumento nacional, foi outrora paradigma do luxo (foi fundado em 1924 e teve os dois primeiros elevadores do país), agora tem três estrelas; por aqui passaram reis, presidentes, estrelas da idade de ouro de Hollywood (Orson Wells bebeu 42 piscos sours seguidos, Ava Gardner passeou em vestido transparente, os Rolling Stones foram daqui expulsos); nós deixamo-nos deslumbrar pelo átrio neoclássico encimado por uma abóboda com vitrais como se estivéssemos na Paris do início do século.

Voltamos à Praça de Armas, para passar pelo Portal dos Escribanos e deambular por ruas pedonais ladeadas de restaurantes (em breve aqui será o “boulevard da comida peruana”), com o monumento a Taulichusco, uma pedra numa pequena rotunda de terra, canteiro de flores, e entrar na livraria Virrey de Lima. Entrando antes pelo Jirón de Carabaya seguimos entre a fachada lateral do palácio governamental e lojas de artesanato (com variedade infindável de produtos peruanos e bons preços, sobretudo se compararmos com Cuzco) em direcção à Casa da Literatura Peruana. Não entramos, ficamo-nos pelo Cordano, o café em frente, 109 anos bem contados, um charme fin-de-siècle decadente, com as madeiras gastas, e a melhor butifarra (sanduíche de baguete e fiambre peruano, grosso) da cidade (como é a única que provamos, não colocamos em causa a vox populi, entre elas a de uma portuguesa a viver em Lima).

É um dos monumentos incontornáveis da cidade e também nós vamos ao Convento de São Francisco. Somos recebidos por uma manifestação de funcionários da administração pública, controlada ao longe por meia dúzia de polícias: “Não temos reforma”, conta um dos manifestantes que trabalhou 20 anos no sector dos transportes e comunicações, “Fujimori prejudicou-nos e estes não nos ajudam.” Por isso, três vezes por semana manifestam-se, normalmente diante do congresso. “Por la unidad sindical”, lê-se em alguns cartazes; “CGTP”, lá como aqui, portanto.

No adro empedrado, rodeado de gradeamento, há vendedores ambulantes e mulheres com trajes típicos em busca de fotografias remuneradas. Diante de nós o edifício, construído entre 1542 e 1674, igreja e convento a desenharem um canto, a igreja a abraçar o convento do alto das suas duas torres. No convento, uma profusão de azulejaria (de Sevilha) recobre os claustros (bastante danificados pelo terramoto de 1974), cujo jardim tem árvores de lúcuma, uma das frutas nacionais, dos quais se acede à biblioteca (desde o século XVI reuniu 25 mil volumes — estes em boas condições, a sala, forrada de estantes com um primeiro andar em varanda, à espera do muito necessário restauro) e ao Museu de Arte do Vice-Reino; mas a estrela aqui são as catacumbas. As fotografias são proibidas no local que serviu de cemitério durante a época colonial e que nos seus corredores estreitos e baixos que desembocam em pequenas salas ainda exibem ossadas.

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