Fugas - Viagens

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Na Jordânia, entre o mar e o deserto

Wadi Rum, ou “Vale da Lua”, é um enorme vale no Sul da Jordânia, a 60 quilómetros a leste de Aqaba, com uma área aproximada de 720 quilómetros quadrados (74 mil hectares). Em Junho de 2011, foi classificado pela UNESCO como Património Mundial. A ocupação humana data do Paleolítico, numa altura em que a paisagem seria drasticamente diferente, com numerosas espécies animais e vegetais que, gradualmente, desapareceram com o processo de desertificação. A água foi e é um elemento essencial neste deserto. A sua presença deve-se à estrutura do subsolo: as fundações de granito impermeável impedem que se perca no subsolo. As nascentes existentes tornaram o local num ponto de passagem obrigatório das caravanas comerciais, que ligavam a península arábica ao norte.

Um café no deserto

A viagem de jipe pelo trilho do deserto durou perto de meia hora, até chegarmos a um ponto abrigado do sol escaldante. Aguardava-nos um pequeno grupo de beduínos e 20 camelos. Homens e animais tranquilamente sentados. Montámos as pacíficas e lerdas criaturas, que se ergueram, faseadamente, contrariadas. Seguimos, lentamente, em direcção a um formoso desfiladeiro de Wadi Rum. Parámos junto de três outros beduínos, atarefados em volta de uma mesa de madeira comprida. Preparavam um almoço tradicional do deserto, com muitos vegetais, pedaços de frango e cordeiro. Somos convidados a participar. No chão está estendido um grande tapete onde iremos comer e repousar. A uns metros de distância, atrás de um arbusto, uma silhueta negra capta-me a atenção. Olho mais atentamente e vejo uma mulher de burqa preta ajoelhada no chão, silenciosa e imóvel como uma estátua. Mais tarde, os homens vão permitir que nos aproximemos dela, para a ver fazer o tradicional shrak (pão beduíno), numa grande chapa oval, sobre uma pequena fogueira, com uma inesperada agilidade.  

Na tradição beduína, comida e bebida têm hierarquias. No topo, em termos de importância simbólica, está o café. A sua preparação e oferenda são essenciais na hospitalidade deste povo. Por norma, quem trata da bebida é o próprio chefe da tribo ou do clã. Numa frigideira de ferro, com uma longa pega, o nosso anfitrião frita os grãos verdes. Esmaga-os de seguida, num almofariz, de forma ritmada, e despeja tudo, cuidadosamente, numa cafeteira de água fervida. Junta-lhe algumas sementes de cardamomo, uma especiaria que lhe empresta o sabor característico. E está pronto. Servi-lo envolve todo outro cerimonial e o desrespeito da etiqueta é ofensivo. Para os beduínos, o café está relacionado com a hospitalidade, generosidade e responsabilidade. É uma linguagem prévia às palavras. Enche-me um pequeno copo de plástico e entregou-me com a mão direita. Se fosse com a esquerda, estaria a dizer que não era bem-vindo e que fosse rapidamente embora. A bebida é amarga e forte, não particularmente saborosa para o meu paladar. Sorvo até à última gota.

A maioria da população jordana é de origem beduína e isso reflecte-se profundamente na identidade do país. O estilo de vida destes árabes nómadas, os “habitantes do deserto”, tem sofrido drásticas alterações desde o século XIX. Muitos foram forçados à sedentarização pelo Império Otomano, para facilitar a cobrança de impostos. O final da I Guerra Mundial reforçou esta tendência. Habituados a circular livremente, passaram a ser submetidos ao controlo governamental, que os circunscreveu aos limites fronteiriços dos novos estados independentes. Na Jordânia, os actuais beduínos combinam dois estilos de vida: os sedentários e aqueles que ainda praticam a pastorícia. Estes acampam por alguns meses em determinado local, com as suas cabras, ovelhas e camelos. E por ali ficam até esgotarem as forragens. As únicas concessões que fazem ao mundo moderno passam, em alguns casos, pela aquisição de uma pick-up (para transportar animais), garrafas de água de plástico ou um pequeno fogão de querosene. O governo jordano que, no passado, promoveu fervorosamente a fixação dos beduínos, reconhece o seu papel ímpar na cultural e património nacionais. Diz que são “a espinha dorsal do reino”. Os cuidados de saúde, educação e habitação para estas populações têm sido reforçados nos últimos anos. Mas alguns, cada vez menos, continuam a rejeitar apoios, mantendo inalterado um estilo de vida que os serviu durante séculos.

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